sexta-feira, 7 de junho de 2013

A pera



A pera estava ali, num imobilizado exibicionismo, debruçada sobre a simplicidade de despeitadas bananas. Ele havia esperado até aquele momento para colhê-la, pois, ao contrário de ontem, ela se mostrava agora, desde um viçoso amarelo, que estava suficientemente madura para tornar-se definitivamente a fruta que dela se espera, ao desaparecer por entre os lábios, a língua e os dentes de um humano.

Após a primeira mordida, ele não sentiu no paladar a suculenta areia adocicada no que se transforma a carne de uma deliciosa pera madura. O gosto que lhe veio à boca foi o de um desenxabido sabor.

Experimentou, já desanimado pela frustração, mastigar um novo pedaço da pera, na esperança de que pelo menos o outro lado da fruta, por alguma razão, tivesse amadurecido. O mesmo gosto sem graça, o mesmo sabor de coisa nenhuma.

Olhou para a pera com olhos de quem olha para algo que já perdeu seu valor e, sem nem um outro sentimento além do de decepção, atirou-a no lixo.

Mal acabou de ouvir o barulho surdo da pera caindo no fundo do cesto, veio-lhe um pensamento perturbador. Tal como a pera, ele, àquela altura de sua existência, possuía a vivência e a aparência de alguém de quem se diz ter alcançado a tão ansiada maturidade. Seria isso mesmo verdade? Desde o seu ponto de vista, tal possibilidade estava muito longe de ser confirmada. Seria mesmo o caso de, segundo ele, em vez de jogar a pera sem graça, juntar-se a ela no mesmo salto em direção à inutilidade do que um cesto de lixo ajunta.

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