sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Goethe e Barrabás, Deonísio da Silva



No prólogo de A invenção de Morel, obra de seu grande amigo Adolfo Bioy Casares, Jorge Luis Borges empreende uma instigante discussão, tensionando as virtudes e os defeitos do romance psicológico em relação ao romance de aventura ou de peripécia.
Em primeiro lugar, ele apresenta o desdém de Stevenson em relação ao romance de aventura ou peripécia, afirmando que um bom escritor demonstra sua habilidade escrevendo um romance “sem argumento ou de argumento infinitesimal”.
Borges exemplifica o romance psicológico, como sendo um bom modelo para a boa narrativa apontada por Stevenson, pois ele “tende a ser informe” e “tende a [uma] liberdade plena [que] acaba por equivaler à plena desordem”. Enquanto que, o romance de aventura ou de peripécia, “é um objeto artificial que não admite nenhuma parte injustificada. O temor de incorrer na mera variedade sucessiva do Asno de ouro, das sete viagens de Sinbad ou do Quixote impõe-lhe um rigoroso argumento”.
O romance de Deonísio da Silva me fez pensar em tais questões. As características evidenciadas por Stevenson como positivas sobejam em Goethe e Barrabás, embora este romance não possa ser considerado, stricto sensu, como um romance psicológico, ainda que haja ali inúmeros lampejos oníricos e mesmo acercados de um inevitável nonsense.
Às vezes parece um romance autobiográfico, bem ocultado entre fatos e tramas; às vezes ele se quer como uma narrativa de peripécia, mas falta-lhe a constância e o argumento que tanto Borges exige; às vezes não quer nenhuma coisa nem outra, apenas tornar-se romance porque precisa sê-lo, como sugere esse diálogo entre Barrabás e seu amigo Quarto-Crescente, já no último capítulo:
“- E o que está escrito nele?
- Goethe e Barrabás. É uma porção de historinhas, assim encordoadas umas, separadas outras, tudo muito confuso, mas o assistente disse que é assim que é um romance.” (p. 187).
 (Novo Século)

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